Opinião: "A Casa" de Emma Becker

Emma Becker é uma autora que decidiu escrever um livro diferente. Após completar o curso de Letras na Sorbonne, e movida por uma curiosidade que, segundo ela, sempre a acompanhou, decide introduzir-se no mundo da prostituição, a fim de mais tarde partilhar a sua experiência, em forma de livro. Sendo Francesa, muda-se para a Alemanha, onde a prostituição é legal e existem casas para o efeito, onde grupos de mulheres fazem turnos, oferecendo os seus serviços a troco de dinheiro.

O que me fascinou neste livro foi o facto de a autora ter conseguido afastar-se dos clichés e dos lugares comuns, das opiniões pré-concebidas e fantasiosas, influenciadas pela indústria cinematográfica. Tendo escrito o livro a posteriori, ela deu a si própria o tempo suficiente para se distanciar e escrever com a imparcialidade necessária, mas com o profundo conhecimento que a experiência lhe proporcionou.

Eu estava com algum receio de ler este livro, não só porque não me agradam leituras demasiado visuais e chocantes, como não sou fã da vulgaridade na linguagem escrita (nem na falada!). No entanto, passadas as primeiras páginas, eu percebi que apesar de a autora não hesitar chamar as coisas pelos nomes, afasta-se da vulgaridade, e eu não me senti chocada.

Insere-se então numa primeira casa, chamada de Household, onde logo desde o início não se sente à vontade. Lembremo-nos que o seu objetivo final não era público. Emma seria apenas uma francesa a desempenhar o trabalho de prostituta em Berlim. Mas naquela casa, apesar de não ter sido maltratada pelas colegas, ou explorada pela entidade patronal, ela sente-se algo insegura. Não existe nenhum elo formado entre as mulheres, mas sim uma rivalidade que a entristece. Ali ela demora-se apenas duas semanas e segue caminho.

Descobre então uma outra casa: “A Casa”. Aí ela encontra o seu lugar, e acaba por descobrir que existe uma cumplicidade maravilhosa entre aquelas mulheres. Muitas delas encaram o trabalho de prostituta como um segundo emprego, apenas para completar o ordenado. Chega a ter como colegas três enfermeiras! Não há rivalidades. Cada mulher cumpre as suas tarefas com consciência, tendo a perfeita noção que as que trabalham ao seu lado são suas “irmãs”. Existe uma fraternidade na Casa que Emma não hesita de chamar de mágica, com amizades misteriosamente leais. Mais do que pelo trabalho, ou pela experiência, Emma apaixona-se pelas Mulheres da Casa. Cada uma com as suas características, peculiaridades, gostos e maneiras de ser. O trabalho é como outro qualquer. Elas é que fazem a diferença. Os clientes também aparecem na narrativa, mas apenas para dar forma ao trabalho em si. No entanto, Emma não se coíbe de os analisar igualmente. E aos seus sentimentos.

Senti este romance quase como um estudo sociológico sobre as mulheres com esse trabalho na sociedade contemporânea. E não me arrependo nada de o ter lido. Bem pelo contrário. É uma obra extraordinária, que me deixa curiosa sobre o próximo projeto desta autora. Recomendo.

 

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