Talvez por ter nascido fora da época. Ou seja, nasci vinte anos mais tarde do que devia (a minha mãe tinha 41 e o meu pai 46 anos). Ele era um homem severo, salazarista, e eu uma inútil rapariga. Acreditam que só no 9.º ano tive autorização para usar calças? Enfim... Esta é uma das razões porque gosto tanto de ler sobre essa outra época, vinte anos antes do meu nascimento, sensivelmente na altura em que Luísa Castel-Branco era uma menina, e cujos tempos agora recorda neste livro.
"Quando eu era pequenina" é o primeiro livro de um conjunto de três, e nele Luísa recorda exatamente a sua infância. As recordações de uma Lisboa de outros tempos, e dos arredores de outros tempos, quando ainda não eram dormitórios, mas tinham vida própria. As recordações também do seu lugar de férias, com o qual (tal como eu!) ela não tinha nenhuma ligação própria. Foi adotado pela sua família como a "terra" para onde se ía nas férias (no meu caso, pasmem-se, era Entre-os-Rios! Mais precisamente as Termas da Inatel).
Adoro o tom com que ela nos conta curiosidades e situações sobre a sua meninice, enquanto simultaneamente se auto-psicanaliza. Tem toda a razão, cara Luísa, a escrita é a melhor forma para lidarmos com os sentimentos e traumas. Libertamos as nossas frustrações no papel e de imediato nos sentimos mais leves. Para quem gosta de escrever, não há melhor terapia!
Resumindo, gostei mesmo muito. Acaba por ser um livro que nos obriga a crescer, pois ao olharmos para nós próprios também quando éramos crianças, apercebemo-nos da distância e da importância de certas coisas, e acabamos por ficar bem com elas. Acredito sempre que, acima de tudo, temos de fazer as pazes com o nosso eu-criança. Só assim conseguimos crescer.
Bem haja, Luísa. Fico à espera da continuação.