"Um Amor em Tempos de Guerra" de Júlio Magalhães

Sinopse:
António nasceu marcado pelo nome. O mesmo que o vizinho da rua das traseiras, o homem que se fez doutor em Coimbra e que ia à terra sempre que podia, o tal que governava o país com pulso de ferro. Mas de pouco ou nada lhe valeu tão grande nome quando o destino o enviou para Angola, para defender a pátria em nome de uma guerra distante que não era a sua. Deixou para trás a sua terra, a mãe inconsolável e Amélia, a mulher que pedira em casamento, num banco de pedra, junto à igreja e que prometera fazer dele o homem mais feliz de Vimieiro. Promessa gravada num enxoval imaculado que ficou guardado no armário, à espera do fim daquela maldita guerra. Quando António regressou de Angola, era um homem diferente. Marcado no corpo por anos de guerra e de cativeiro e no coração por um amor impossível que deixara em pleno mato angolano. Regressava para cumprir a promessa que fizera anos antes à sua noiva Amélia, que o julgara morto, e que, em sua memória, tinha enterrado um caixão sem corpo.

A minha opinião:
Foi a primeira vez que li algo escrito por Júlio Magalhães. Confesso que não o tinha em grande conta como escritor. Depois de saber que segundo ele «Todos escrevemos, quem escreve uma mensagem num telemóvel também pode escrever um livro», acreditem que foi difícil dar-lhe uma hipótese. Mas, como o tema em particular me atrai imenso (tenho muita curiosidade sobre a época em que nasci - finais dos anos 60, início dos anos 70) lá me convenci a pegar nesta leitura. E devo dizê-lo, não me arrependi.
É uma história de amor muito bonita, bastante real, e escrita de uma forma simples, quase que como relatada. Aborda o tema da guerra do Ultramar, mas sem se perder em grandes e terríveis relatos sobre os combates além mar. O dramatismo da situação é vivido com seriedade, e acho que o autor conseguiu transmitir os sentimentos das personagens com rigor: a impotência e o desespero da mãe, ao ver o filho partir, as saudades e as dúvidas da noiva, a dor e a angústia de António ao ver a sua vida colocada em pausa, partindo para uma guerra sem sentido.
No fundo tenho de admitir que gostei.
Mas... (há sempre um "mas") acho que se nota a falta de experiência do autor.

Na página 237 podemos ler "O comboio foi abrandando à medida que se aproximava a estação de Santa Comba Dão. «Próxima paragem, estação de Santa Comba Dão.»" - supostamente o anúncio para os que viajavam naquele comboio. Ora a questão é que 1975 não havia esse tipo de anúncio, muito menos num comboio que parava em todas as estações e apeadeiros, como era o caso. Na realidade o sistema de som só começou a ser implementado nos comboios 10 anos depois, 1985 /86.

Outra falha que notei foi a omissão por completo do quão complicado era para uma rapariga ser professora e poder casar, nos tempos de Salazar. Amélia, andava no liceu com o objectivo de ser professora, mas não se coibia de compor o seu enxoval e fazer planos para casar, quando no fundo era exigido à professora primária uma dedicação a tempo inteiro, sendo que para casar, seria necessária uma autorização especial.

Estas duas "falhas" de que me apercebi, são na verdade consistentes com a incapacidade que notei ao longo do livro que o autor demonstra em conseguir se entregar por completo aquela época. Duvido que seja intencional, e por isso atribuo-a à sua "verdura" como autor. (Afinal, não é de todo como escrever uma sms!)
A meu ver os diálogos entre as personagens são demasiado actuais. Isto é, o tipo de conversa não está adequada à época em questão (neste aspecto Tiago Rebelo é um mestre). As personagens entre si conversam como se estivem nos dias de hoje. Por exemplo notei apenas uma vez, salvo erro, em que o filho se dirige à mãe como "senhora minha mãe", embora nessa altura fosse esse o timbre utilizado no tratamento aos progenitores.

Mas isto são apenas pormenores. Quando olhamos para o livro como um todo, acabamos por gostar. Acho que um dia destes também vou experimentar o outro livro dele "Os Retornados" e fico à espera de um novo título, também com curiosidade sobre a sua evolução.
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